15/02/2021 às 14h13min - Atualizada em 15/02/2021 às 14h13min
Minha primeira viagem à Europa
Por Odair Camillo - Jornalista
Orestes Alves Corrêa (esq.) e Odair Camillo (dir.) na frente do Palácio de Buckingham, em Londres No finzinho da década de 80 fiz minha primeira viagem à Europa acompanhado do casal amigo Bibiana e Orestes Alves Corrêa. Praticamente iniciantes em viagens internacionais, optamos por comprar um pacote de pouco mais de três semanas numa excursão de ônibus para os mais conhecidos e tradicionais países europeus, tendo como ponto de partida a capital espanhola.
Geralmente as excursões pela Europa são uma alternativa para quem quer conhecer um maior número de destinos no continente, sem muitas preocupações. Elas são acompanhadas com guias que falam português e/ou espanhol, oferecem um ótimo custo-benefício para a viagem, podendo tornar-se muito mais animada e divertida.
A operadora por nós escolhida era, e ainda é, uma das mais conceituadas cujo pacote incluía a hospedagem em hotéis de categoria turística, toda a logística de deslocamento e os principais passeios, bem como algumas refeições. Todo o itinerário foi cuidadosamente elaborado para haver um melhor aproveitamento possível do tempo, de forma que, no trajeto percorrido de uma cidade a outra, fossem feitas, inclusive, paradas em atrativos que ficavam no meio do caminho. Sempre procurei evitar viajar em excursões
Confesso que nunca gostei de excursões, já que temos que ficar condicionados a horários e, muitas vezes, ter que visitar lugares que você não gostaria de ir, se sozinho estivesse. Por outro lado, a excursão nos dá a oportunidade de conhecer vários destinos, mesmo que superficialmente, mostrando-nos uma visão geral de tudo e fazendo com que, numa outra oportunidade, possamos escolher o lugar que gostaríamos de rever, com mais tempo e objetividade.
Durante a excursão, uma das cidades que admirei na costa oeste da Espanha foi Bilbao, principalmente o seu Casco viejo, o centro histórico da cidade, localizado ao redor das sete calles, entre a catedral e o rio, um ótimo lugar para experimentar a culinária local. A cidade se tornaria alguns anos depois, em 1997, mundialmente conhecida por abrigar o Museu Guggenheim, um edifício vanguardista de autoria de Frank Gehry, cuja obra se tornou o ícone da cidade.
Mas foi em Bordeaux, na França, que pela primeira vez tive contato com um vinho de qualidade excepcional. Não é à toa que quando se ouve a palavra Bordeaux, você imediatamente pensa em “vinho”. E dos bons...
Poucos minutos de viagem, está Saint Emilion, uma pequena aldeia de Bordeaux, mundialmente conhecida pelos seus vinhos.
O motorista de osso ônibus, deliberadamente, fez uma parada num dos chatôs para degustar alguns vinhos e saborear os quitutes locais. E não deu outra. À saída, eu e a maioria dos excursionistas trazia consigo uma ou duas garrafas dos famosos vinhos daquela região. O companheiro Orestes, sempre apreciador de bons vinhos, foi mais audacioso. Comprou uma caixa deles que, ao final, acabou dando-lhe grande apreensão e trabalho durante todo o trajeto a ser ainda percorrido até o fim da viagem, tendo ele próprio que acomodar a caixa no bagageiro do ônibus, toda vez que partíamos para novos destinos. Mas enfim, acabamos conhecendo as capitais Madri, Paris, Londres, Bélgica, Suíça, Áustria, Itália, e passagens rápidas pelas cidades de Burgos, San Sebastian, Lourdes, Vale do Loire, Versalhes, Bruges, Innsbruck, Veneza, Assis, Florença, Pizza, Nice, Mônaco e Barcelona. Na Europa, fiquei sabendo que Collor havia confiscado todo o meu dinheiro
Na tarde de sexta-feira, 16 de março de 1990, estava com Lurdinha, Orestes e Bibiana sentados para uma happy hour à uma mesa num dos gostosos barzinhos da Gran Via, em Madri, quando ficamos sabendo que o presidente Fernando Collor de Mello, que havia tomado posse no dia anterior, anunciou em cadeia nacional um pacote radical de medidas econômicas para conter a hiperinflação que dominava o Brasil.
A ministra da Economia Zélia Cardoso de Mello, juntamente com sua equipe, havia elaborado um pacote de medidas que acabou estourando como uma bomba - e a parte mais explosiva do plano consistia no bloqueio, por 18 meses, dos saldos superiores a NCz$ 50 mil nas contas correntes, de poupança e demais investimentos de todos os brasileiros. Além do confisco, a ministra anunciou ainda o corte de três zeros no valor da moeda e a substituição do cruzado novo pelo cruzeiro.
A notícia nos chegou através de um casal uruguaio que também fazia parte da excursão e que tinha parentes residindo no Brasil.
No mesmo instante, tanto Orestes como eu procuramos um telefone público para entrarmos em contato com nossos filhos. E, segundo eles, a tragédia havia sido consumada. Daquele momento em diante, nós, os brasileiros, estávamos ainda mais pobres...
Ainda bem que já estávamos de partida de nossa agradável excursão à Europa. No domingo, retornaríamos ao Brasil, sem saber o que realmente havia acontecido e o que iria acontecer aos brasileiros, órfãos de um sistema político corrupto e desastrado, já que antes do anúncio do plano Collor, o País havia mergulhado na hiperinflação, atingindo o índice de 84% ao mês.
Ao desembarcar na segunda-feira em Guarulhos, sem saber o que realmente havia restado de minha modesta conta bancária, o único consolo que tive foi a comparação com a conta de um grande e famoso empresário paulistano: afinal, Antonio Ermírio de Moraes deveria ter o mesmo saldo bancário que o meu! (Continua na próxima crônica que será publicada ainda esta semana)