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Sabores patagônicos

Lauro A. Bittencourt Borges - cronista gastronômico, viajante compulsivo e membro da Academia de Letras de São João da Boa Vista
29/04/2025 15h15 - Atualizado há 2 dias
Sabores patagônicos
Depois das trilhas, a recompensa que alimenta e aquece

 

No avião, entre Santiago e Punta Arenas, a gastronomia da viagem começou bem ruim. Ainda bem que o chão firme da Patagônia e seus sabores redimiram o desastre culinário do voo.

 

Cebolitos e pipoca doce
Rumo ao extremo sul das Américas, a comissária da Latam me desperta às 5 da madrugada para o desjejum. Sonolento, ouvi daquele espanhol metralhado dela que as opções de refeição seriam um pequeno suflê de cabrita e um bolo de caramelo. Vibrei com a excêntrica oferta culinária. Minha fome patagônica e minha curiosidade por um café da manhã típico obrigaram-me a pedir os dois. Que tristeza! Que vontade de pular do avião quando recebi os pacotinhos com oito gramas de cebolitos e dez de pipoca doce. Desde os 7 x 1 eu não me sentia tão impiedosamente derrotado. Josi, ao lado, cometia sua primeira gargalhada do dia, ainda nos céus da Patagônia.

 

Empanadas da Chacrita de Nimez
Voltando do indescritível Perito Moreno, peço ao ChatGPT que me indique a melhor empanada de El Calafate. Esperava, confesso, alguns lugarzinhos da moda na Avenida del Libertador. Ficamos, eu e Josi, ressabiados diante daquele estabelecimento perdido num trecho ermo defronte ao lago Nimez. Ainda assim, a curiosidade venceu a desconfiança. Um jovem casal nórdico, com seus dois filhos, era a única presença naquele ambiente um tanto psicodélico. Gostei do que vi - e do que ouvi: uma playlist roqueira, anos 80 e 90, daquelas que merecem respeito. As empanadas - de carne, cordeiro, cebola com queijo - eram “argentinamente” fantásticas. E o ChatGPT, veja só, afinadíssimo com meu gosto meio underground. Nem precisava do jarrão de cerveja artesanal ou da panqueca com doce de leite. Eu viveria das empanadas da Chacrita de Nimez.

 

Trattoria Maffia e o ravioli de cordeiro
Tão célebre quanto o cordeiro patagônico em si, são as massas recheadas com sua carne -especialmente raviolis e sorrentinos. Não poderia deixar El Chaltén sem provar essa pasta estufada com o sabor icônico do extremo sul das Américas. A escolhida foi a Trattoria Maffia: madeira em profusão, poucas mesas, uma bela carta de vinhos, uma dona antipática, garçonetes gentis e um ravioli de cordeiro do tamanho do Fitz Roy.

 

Parillada
Em Santiago, a mesa se põe com sotaque tradicional chileno: pratos clássicos, frutos do mar frescos e, quase sempre, um toque do vizinho Peru, cuja gastronomia conquistou espaço cativo por ali. Já no sul, na vastidão fria da Patagônia, além dos frutos do mar nas cidades litorâneas, o cheiro de churrasco é sentido nas esquinas. Talvez pela vizinhança com a Argentina, abundam restaurantes que servem carne na parrilla. Cortes tão generosos quanto as brasas.

 

Cordeiro patagônico
O cordeiro patagônico é mais do que um prato: é quase um rito. Assado lentamente ao estilo tradicional, em cruzes de ferro inclinadas diante da brasa, ele resume bem a rusticidade elegante da região - carne macia, sabor profundo, gordura na medida. Em praticamente todos os cantinhos da Patagônia ele aparece com destaque nos cardápios, do restaurante mais turístico ao parrillero mais raiz. E, em geral, não decepciona.

O melhor que comemos na viagem - e olha que experimentamos alguns bons -  foi no restaurante Mi Viejo, em El Calafate. A carne veio no ponto exato, úmida, dourada por fora, com aquele gostinho de defumado que só o fogo lento consegue dar. Acompanhado de um vinho tinto e do frio que não dá trégua, foi daqueles jantares que a memória guarda com carinho e um tantinho de saudade.

Na Patagônia, o cordeiro não é só uma refeição, é também ícone da cultura local. E, no Mi Viejo, virou também um capítulo especial do nosso roteiro.

 

 

*O Brand-News não se responsabiliza por artigos assinados por nossos colaboradores


FONTE: Instagram: @lauroborges
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