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17/11/2022 às 15h40min - Atualizada em 17/11/2022 às 15h40min

O mineiro na praia do Gonzaga

Por Odair Camillo
Figura meramente ilustrativa - Reprodução Google
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Depois de um mergulho nas águas ainda frias de uma praia no litoral sul, estendo a toalha sobre a areia, deito-me sobre ela e aproveito para curtir os raios solares, ainda tímidos, desta gostosa primavera.
Junto aos meus pertences, uma caixa de isopor devidamente abastecida com batida de limão, cervejas em lata e porções de tira-gosto, preparados pela minha esposa Lurdinha, que ficara no apartamento.
 
A caixa é uma grande tentação que procuro vencer, pois reconheço - pouco mais de 9h - ser ainda muito cedo para iniciar os prazeres etílicos que a oportunidade oferece.
 
Enquanto folheio o jornal que trouxe do apartamento, observo que um senhor aparentando mais de 70 anos vai se aproximando onde estou, trazendo consigo toda a tralha necessária para ali se estabelecer e também curtir as delícias da manhã.
 
Como não encontro nada de aproveitável na leitura do jornal - os assuntos se restringem basicamente à campanha eleitoral dos presidenciáveis – deixo-o de lado e passo a observar o homem, já que as mulheres, principalmente as “boas”, só vêm à praia por volta do meio-dia.
 
Feio e calvo, pele muito branca, barriga bem proeminente, um calção que mais se parece a um bermudão de tão comprido, o velho enquadra-se perfeitamente no tipo que os gozadores intitulam de “uma figura”.
Bem, isso não vem ao caso! Cada um tem a barriga que Deus lhe deu.
 
Abriu as duas cadeiras de alumínio que trouxe consigo - imagino que a outra seria de sua esposa -, deixou o guarda-sol e uma sacola plástica sobre elas, olhou para o céu por alguns instantes, ensaiou alguns movimentos de ginástica e, logo em seguida desistiu.
 
Procurou na sacola uma loção bronzeadora e passou por quase todo seu corpo que, pelos meus cálculos, numa balança Filizola, encostaria os ponteiros na marca dos 120 quilos.
Em seguida, apanhou o cabo do guarda-sol, que é utilizado para perfurar a areia, escolheu o alvo e começou a tarefa de perfurá-la para fixar o cano.
A cada duas voltas, retirava-o, caminhava dois ou três passos, batia com ele no pé da cadeira para soltar a areia, olhava para confirmar se estava vazio, e voltava para proceder a mesma operação.
 
Durante quase dez minutos repetiu a façanha, deixando o cabo do guarda-sol quase que totalmente enterrado, certamente com receio de que o ventinho gostoso que soprava àquela hora, se transformasse num vendaval, tal a segurança com que o fincou na areia.
Depois, olhou firmemente de um lado para outro, como que à procura de alguma coisa, caminhou alguns passos, curvou-se sobre a areia, apanhou um objeto que não pude identificar, e dirigiu-se até a água.
 
Dali a pouco retornou com um saquinho plástico cheio d´água e a despejou junto ao cabo do guarda-sol, certamente para torná-lo ainda mais firme na areia. “Realmente um boboca”, penso comigo.
 
Nesse instante, uma loira bem bronzeada, daquelas que a rede do plim-plim apresentava como “Garota do Fantástico”, aproxima-se dele, dá-lhe um beijinho carinhoso na testa e diz:
“Demorei, meu bem? a cama estava tão gostosa!”. Ato contínuo, deita-se de costas sobre a esteira e pede ao velho que lhe passe o bronzeador em seu corpo. Com dificuldade, ele ajoelha-se a seu lado e inicia o “penoso” trabalho.
 
Indignado e invejoso com a cena, levanto-me furioso, abro a caixa de isopor e tomo de um só gole todo o conteúdo da batida de limão que ainda restava na garrafa.
 
Imediatamente, uma sensação de calor toma conta de mim. Ajeito tudo e saio correndo, quase em disparada, e mergulho fundo nas águas tranquilas do Atlântico Sul.
                                                    
Novembro, 1989
Do livro em preparação “Eu Pecador Me Confesso... Inocente”

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