Marcos Carioca é outro amigo que, nos anos 1990, foi para os EUA em busca do sonho além-Crepúsculos. Como quase todos que emigraram, penou muito: padeceu com os primeiros [duros, duríssimos] trabalhos, com o desconhecimento do idioma e com a adaptação à cultura daqueles que, não muito tempo atrás, eram chamados de ianques. Ianque?! No mundo pós-Guerra Fria, acho que o termo ficou um tanto démodé. Tão fora de moda quanto o escrevinhador que assina estas linhas.
Como nem quase todos, Marcolino conseguiu o seu espaço e, hoje, está dignamente estabelecido com a família em Norwalk, Connecticut - ali nas cercanias de Nova York.
Cervejando, anos atrás, na sua morada, o amigo me municiou com algumas histórias hilárias sobre brasucas que, como ele, chegaram ao quintal do Tio Sam com poucas verdinhas, nenhum inglês, mas muita coragem.
Não raras vezes, os aventureiros tupiniquins baixavam nas emergências dos hospitais com os sovacos em carne viva. Zelosos com o asseio pessoal, o desodorante era item essencial nas compras. Nenhuma boa alma os avisou que nem todo spray serve pra perfumar as axilas. Há alguns que são usados para firmar o cabelo das mulheres vaidosas - e que ardem diabolicamente quando encontram pele. Não vou usar aqui a palavra laquê, que também está pra lá de démodé. E dá-lhe rima pobre!
Outra que Marcos me contou, igualmente saborosa, foi sobre os brasileiros recém-chegados, ainda zerados no inglês. Lá pelos idos de 1990/91, o incauto juntava umas doletas, resolvia passear em Manhattan, e - entre uma vitrine e outra - perdia o rumo. Sem saber como voltar e sem GPS na palma da mão, apelava pros telefones de emergência guardados na carteira. Ligava de um orelhão qualquer, invariavelmente instalado numa esquina.
Do outro lado da linha, o compatriota mais experiente perguntava:
- Onde você está?
E o novato, sem pestanejar, lia as únicas placas visíveis no campo de visão:
- Estou na esquina da ONE WAY com a DO NOT ENTER.
Prometo, se o Marcolino me ajudar com mais munição, voltar aqui com outros deslizes pândegos de emigrantes.
Caipiras lesados, metidos a viajantes, também perpetram trapalhadas aos borbotões.
Olhem uma delas aí, cujo protagonista é este lamentável colunista.
Aluguei o carro com o tanque cheio em Las Vegas. Parti rumo a Los Angeles pela longa e escaldante estrada que cruza o deserto de Mojave. Era março de 2013. O veículo da vez era um Ford Fusion todo automatizado - um salto tecnológico em relação ao meu Citroën C3 guerreiro de cada dia. Animado com tanta modernidade, comecei a apertar os botões do painel indiscriminadamente.
Resultado: o teto solar abriu e o banco começou a esquentar.
Deve ter sido a primeira chuva naquele deserto em anos. E lá estávamos nós, cruzando Mojave com água pingando na testa. O teto solar, claro, não funcionava manualmente. Vai daí que tomamos um bom banho até eu, no susto e na molhaceira, finalmente achar o dispositivo certo pra fechar a coisa.
Quanto aos bancos aquecidos - pensados pro inverno rigoroso -, a princípio foram motivo de aflição. Sem saber da função, no auge do desconforto da bunda fervente, soltei algo mais ou menos assim:
- Que merda! Essa lata-velha deve estar com superaquecimento!
E lá fiquei eu, com as nádegas assadas por bons minutos, até finalmente localizar o botão de regresso à bunda fria.
Depois de muito rodar por Los Angeles, fui dar combustível ao beberrão em Santa Monica, uma simpática localidade litorânea da Califórnia. Já sabendo do sistema self-service dos postos, cheguei pra abastecer com o roteiro mental pronto pra não dar nenhuma mancada.
De pronto, a bomba não leu meu cartão de crédito e me mandou ao caixa. Sim, é isso: lá as máquinas mandam em você. Já fiquei meio puto pela escorregada do script, mas vá lá - fui ao atendente, paguei, falei o número da bomba e pedi pra botar 40 doletas.
Crédito liberado, volto pra bomba. Disparo o gatilho umas dez vezes - e nenhuma gota pra saciar a sede do azulão.
- Caramba, merda, o que eu tô fazendo de errado? - resmunguei.
Pedi socorro a uns hispanos numa velha caminhonete, e um deles, percebendo meu inglês sofrível, foi gentil no idioma ibérico:
- ¿Qué pasa, hombre?
Meu espanhol quase perfeito proporcionou isso:
- ¡No pasa! No pasa mi cartón e la buemba no funciona!
Volto ao caixa e, finalmente, o funcionário sai do guichê, mexe na coisa e me absolve de qualquer responsabilidade. Minha primeira vez como frentista não foi das melhores, mas, acreditem!, a culpa foi do equipamento.
Em tempo: falei de spray aí em cima. Desodorantes e laquês têm suas serventias, mas o spray que ganhou minha adoração nos EUA foi o de manteiga. Prático demais pra untar assadeiras e sanduicheiras e, tirando a gordura, inofensivo para sovacos de forasteiros monoglotas.
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