24/06/2024 às 14h49min - Atualizada em 24/06/2024 às 14h49min
Ontem, socialistas. Hoje, socialites
Jornalista, publicitário, escritor e professor universitário
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Figura meramente ilustrativa - Reprodução Google
Meus primeiros passos no jornalismo ocorreram na capital paulista, no início da década de 1980, quando como “foca” (jornalista iniciante) arrumei uma vaguinha (que não durou muito, pois o jornal foi ‘lacrado”) no “Voz da Unidade”, periódico do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Minha função, não remunerada, era escrever sobre o calendário comunista. O referido jornal, salvo engano, durou até os primeiros anos da década de 1990.
Naquele tempo, as mulheres militantes, eram, em sua maioria, jovens “ripongas” de calças jeans e tênis, camisetas brancas estampadas com a célebre foto de Che Guevara. Os homens, de camisa social por sobre a calça preta, sapatos pretos, cabelos desalinhados e barba por fazer, bradavam contra o capitalismo tendo debaixo dos braços um exemplar de “O Capital”, de Karl Marx.
Confesso que havia um encantamento ideológico que inebriava a quem, como eu, estudante de jornalismo, tentava entender as causas das injustiças sociais. Me lembro até do Lindbergh Farias que iniciava sua carreira política como líder estudantil.
Hoje, muitos daqueles jovens são os mesmos que, continuam a falar sobre a “direita golpista”, a luta de classes, a mais valia, porém, não abdicam de se alimentarem do luxo e das benesses do Sistema, tecendo críticas ferrenhas contra a elite que é exatamente a classe à qual pertencem na atualidade, embora nunca admitam. Residem em apartamentos luxuosos do Leblon e, vez em quando, filosofam sobre a vida dura de quem mora em Cascadura, culpa, claro, do “capitalismo selvagem”.
No andar de cima da política, viajam o ano inteiro para o exterior, sempre em primeira classe no avião, no hotel, nos restaurantes, gastando milhões de dólares, quer seja, dos fundos governamentais, quer de fundos das portas do fundo da política, filosofando sempre sobre o que acontece no andar de baixo.
Comentar sobre a miséria humana, legislar sobre justiça social, defender as minorias e os excluídos, fica mais eloquente e saboroso, durante um jantar à luz de velas em um restaurante “elitista”, degustando um salmão e deliciando-se com uma geladíssima champagne Moet & Chandon, não é Xandão?
Dias atrás dialogava com um amigo sobre o aniversário de 80 anos de Chico Buarque, um dos grandes compositores brasileiros, de impagável talento, que vivendo em Paris, vive também comentando sobre as “agruras” do cidadão brasileiro. Imaginei-o cantando para alguém do mais alto posto da nação de maneira ululante. “Apesar de você amanhã há de ser outro dia. Eu pergunto a você onde vai se esconder da enorme euforia”.
Como afirmava Nelson Rodrigues, muitos intelectuais da “esquerda festiva” são como cientistas de laboratório. De posse de um microscópio em um ambiente controlado, analisam as causas da existência dos marginalizados sociais, indignando-se com as injustiças provocadas, afirmam, pelo poder do capital. Contudo, minutos depois, retornam para as suas mansões palacianas e lavam suas mãos com álcool em gel, importado, claro.
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