28/10/2021 às 16h32min - Atualizada em 28/10/2021 às 16h32min
Cerveja com milho ou arroz é cerveja?
Jean Benetti - Sommelier de Cervejas
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Tem sido cada vez mais frequente, no mundo cervejeiro, o debate acerca das “cervejas” do estilo American Lager (antes chamado de American Standard Lager), bebida produzida com quase 50% de milho ou arroz em sua receita, em substituição ao chamado “puro malte”. No Brasil, esse estilo é chamado erroneamente de Pilsen e é, sem dúvida, o estilo mais presente nas prateleiras de todos os supermercados.
Mas você sabe o que fez com que uma bebida de 7 mil anos de história tivesse sua receita alterada somente no último século?
A transformação da bebida se deu a partir da crise financeira decorrente do pós-Guerras Mundiais. Para que se tenha ideia dos seus efeitos sobre a cerveja, os Estados Unidos dispunham, em 1880, cerca de 2.300 cervejarias, número que caiu para 60 depois da 2ª Guerra Mundial; no Reino Unido, milenar polo cervejeiro, as tradicionais “breweries” caíram de 6.447 para 358 estabelecimentos. Isso se deu por diversos fatores, mas, principalmente, em razão da escassez de mão de obra e das restrições ao consumo de álcool em alguns países, fenômeno que impactou profundamente a produção do malte. Com a escassez do malte, seu preço, naturalmente, subiu e impôs aos produtores a necessidade de encontrarem alternativas na produção de uma bebida mais barata, que voltasse a ser consumida por uma população financeiramente “quebrada”. A solução foi substituir o malte por cereais de produção mais abundante e barata, como o milho e o arroz.
Soma-se a redução do preço ao modelo social extremo e massificante que marcou o século XX, no qual campanhas de publicidade “venderam” a ideia de que as cervejas “não puro malte” seriam os ideais ocidentais de consumo, e o resultado foi a produção de uma bebida padronizada e sem personalidade, mas consumida em largas escalas.
Com o tempo, o paladar do consumidor se acostumou a um produto inferior em aroma e sabor, fato que, talvez, explique as reações de “forte” ou “amarga” quando muitos experimentam outros estilos de cervejas.
No Brasil, não foi diferente, e o nosso clima contribuiu para difundir a cultura da “cerveja estupidamente gelada”. Acontece que, com menos de 2ºC, a bebida anestesia nossas papilas gustativas e passamos a sentir apenas uma sensação de frescor, estimulada pela grande quantidade de gás carbônico adicionada ao líquido.
Mas o mundo mudou e os consumidores, cada vez mais exigentes e curiosos, passaram a conhecer alternativas para a bebida elaborada com adição de milho ou arroz, e a se indagarem se, tecnicamente, essa bebida pode ser chamada de cerveja.
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