04/11/2024 às 15h13min - Atualizada em 04/11/2024 às 15h13min

Vacina terapêutica para câncer de próstata, desenvolvida por cientista brasileiro, avança com aprovação do FDA e tem primeira coleta de paciente

FONTE: Leonardo Bandeira - [email protected] - FOTOS: Divulgação
Esta é a primeira vez que uma tecnologia desenvolvida no Brasil chegou a este estágio de aprovação nos Estados Unidos

 
A nova imunoterapia personalizada para câncer de próstata, desenvolvida por cientista brasileiro e aprovada pelo FDA, tem o potencial de economizar bilhões de dólares para os sistemas de saúde, reduzindo a recorrência da doença de 36,8% para 11,8%. Com investimentos privados e públicos na ordem de R$ 70 milhões ao longo de 25 anos, a tecnologia promete transformar o Brasil em um polo de inovação científica e médica no combate ao câncer
 
A última semana foi marcada por um momento histórico na luta contra o câncer de próstata: o primeiro paciente americano foi tratado com uma inovadora imunoterapia personalizada, desenvolvida por cientistas brasileiros, em um estudo clínico de Fase 2 adaptativo aprovado pelo FDA (Food and Drug Administration). O evento, conhecido como "First Patient In", marca um importante passo no desenvolvimento de novas terapias para prevenir a recorrência da doença e, potencialmente, salvar milhares de vidas.
 
O estudo e a tecnologia: um marco de 25 anos
Essa tecnologia inovadora de imunoterapia, popularmente chamada de "vacina personalizada", foi fruto de mais de 25 anos de pesquisas, liderada pelo médico e cientista brasileiro Dr. Fernando Thomé Kreutz, MD, Ph.D. O estudo clínico, atualmente conduzido nos Estados Unidos, visa testar a eficácia do tratamento em pacientes americanos, após os promissores resultados obtidos no Brasil. 
 
A imunoterapia tem como objetivo principal reduzir a recorrência do câncer de próstata. Dados anteriores apresentados ao FDA mostraram que, em um grupo controle no Brasil, 36,8% dos pacientes apresentaram recorrência da doença, enquanto no grupo tratado com a imunoterapia personalizada, essa taxa foi reduzida para apenas 11,8%. Além disso, houve a tendência de diminuição da mortalidade devido ao câncer de próstata nestes pacientes (de 12.8% para 4.3%).
 
Detalhes do estudo nos Estados Unidos
O estudo clínico nos Estados Unidos contará com a participação de 230 pacientes americanos de 21 centros de pesquisa espalhados pelo país. Cada paciente receberá um tratamento imunoterápico personalizado, desenvolvido a partir de fragmentos do próprio tumor, coletados durante a cirurgia e enviados para um laboratório especializado na Califórnia. Após a preparação da imunoterapia, o tratamento será administrado em sete doses ao longo de seis meses.
 
Os primeiros resultados clínicos são esperados já nos primeiros 90 dias, com dados imunológicos que demonstram se os pacientes estão desenvolvendo uma resposta imune à doença. O estudo tem duração prevista de até 22 meses, mas há expectativas otimistas de que, em aproximadamente 18 meses, se os resultados replicarem os sucessos observados no Brasil, o tratamento poderá ser submetido para registro comercial.
 
O médico explica que o FK-PC101 é uma nova imunoterapia personalizada que apresenta neoantígenos (alvos) tumorais próprios dos pacientes. Serve para o tratamento de pacientes com câncer de próstata com maior risco de recorrência após prostatectomia. É baseado em uma tecnologia patenteada usando as próprias células cancerígenas do paciente para criar Células Apresentadoras de Tumor (TPC) específicas. Pacientes imunizados com um TPC personalizado têm uma resposta imune multi-neoantígeno contra células cancerígenas.


 
Impacto econômico e científico
Segundo o Dr. Fernando Kreutz, além dos potenciais benefícios médicos, o impacto econômico também é significativo. “Estamos lidando com uma tecnologia que, ao evitar a recorrência do câncer, pode gerar enormes economias para os sistemas de saúde. No Brasil, por exemplo, o tratamento de pacientes com terapias celulares já aprovadas custa ao SUS aproximadamente R$ 2,4 milhões por paciente, o que limita a utilização deste tipo de terapia inovadora. A imunoterapia que estamos desenvolvendo tem o potencial de não apenas tratar, mas prevenir a volta da doença, eliminando a necessidade de tratamentos subsequentes e caros”, revela o cientista.
 
O impacto dessa tecnologia é tão relevante que empresas como a Cellvax, nos Estados Unidos, já estão sendo avaliadas com valuation superior a US$ 200 milhões. A empresa será a responsável por conduzir os estudos e comercializar a imunoterapia desenvolvida por médicos brasileiros.  O Dr. Kreutz acredita que a evolução dos estudos clínicos nos EUA e no Brasil pode gerar ainda mais valorização da companhia, além de oportunizar um potencial IPO (abertura de capital nos EUA).  
 
Validação internacional e expansão para tumores gástrico, cólon, pâncreas, vias biliares e câncer de pulmão e aprovação da Anvisa
A tecnologia de imunoterapia personalizada, já reconhecida internacionalmente, está prestes a abrir novas frentes de tratamento com a expansão dos estudos clínicos para outros tipos de câncer em 2025. A recente aprovação do Projeto Arquitetônico no CEVS - ANVISA para a construção do Centro de Processamento Celular (CPC), pela CellMed, em Porto Alegre, permitirá o avanço nos projetos de pesquisa, incluindo estudos sobre tumores gastrointestinais (câncer gástrico, cólon, pâncreas, vias biliares e intestino) e câncer de pulmão.
Com a planta aprovada, a construção do CPC deve ser concluída entre 4 e 6 meses, abrindo caminho para que as pesquisas avancem rapidamente. O CPC será parte da divisão de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em imunoncologia e medicina regenerativa da CellMed, empresa brasileira dedicada à inovação em terapias celulares. A coordenação dos estudos estará a cargo do Dr. Alberto Stein, MD, PhD, urologista, diretor da CellMed e membro das associações Americana e Brasileira de Urologia. Dr. Stein é um dos pesquisadores envolvidos na imunoterapia personalizada para o câncer de próstata.


 
Essas colaborações entre instituições de referência fortalecem o papel de Porto Alegre e do Brasil como centros de destaque na pesquisa oncológica global, impulsionando tratamentos inovadores que podem transformar a vida de milhares de pacientes.
Além disso, o Dr. Márcio Boff, MD, MSc, chefe da Cirurgia Oncológica do Hospital Mãe de Deus, liderará os estudos de tumores gastrointestinais, enquanto o Dr. Cristiano Andrade, MD, PhD, chefe do Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e professor da UFRGS, coordenará os estudos sobre câncer de pulmão.
 
O futuro da imunoterapia no Brasil e nos EUA
O caminho traçado pelo Dr. Fernando Kreutz e sua equipe não foi fácil. "Foram 25 anos de trabalho incansável, com mais de R$ 70 milhões investidos, dois terços de capital privado. Essa jornada é o exemplo de como a ciência, com apoio empresarial e resiliência, pode transformar vidas", ressalta Kreutz. Ele também destaca o apoio de instituições como a PUC do Rio Grande do Sul e o Hospital de Clínicas de Porto Alegre e Feevale, fundamentais para o desenvolvimento inicial da tecnologia.
A expectativa é que, em breve, a imunoterapia personalizada esteja disponível comercialmente tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil. Para tanto, mais investimentos e o acompanhamento regulatório são essenciais.
 
Diferença da vacina terapêutica para a preventiva
VACINA PREVENTIVA:
Objetivo: Prevenir o desenvolvimento de uma doença antes que ela ocorra. É administrada em pessoas saudáveis para estimular o sistema imunológico a criar defesas (anticorpos) contra um agente infeccioso (vírus ou bactéria) antes que a pessoa seja exposta. Exemplos comuns incluem as vacinas contra sarampo, poliomielite e COVID-19.
 
VACINA TERAPÊUTICA:
Objetivo: Tratar uma doença já existente no paciente. É administrada em pessoas que já possuem uma doença (como câncer ou infecção crônica) para estimular o sistema imunológico a combater diretamente as células doentes ou o agente patogênico. No caso do câncer, uma vacina terapêutica pode ser personalizada para ajudar o corpo a reconhecer e atacar células cancerígenas específicas, como no caso da imunoterapia para câncer.
 
SOBRE DR. FERNANDO THOMÉ KREUTZ - É médico, Ph.D. em Biotecnologia, cientista com mais de 30 anos de experiência em pesquisa sobre câncer. Ele compartilha um vasto conhecimento em P&D clínico na indústria farmacêutica, tendo registrado com sucesso patentes para o tratamento de diversos tipos de câncer (tumores sólidos). O Dr. Kreutz é médico formado pela UFRGS (Brasil) e Ph.D. em Biotecnologia pela University of Alberta (Canada).
A pesquisa pioneira do Dr. Kreutz na década de 2000 levou à descoberta de que células cancerígenas tratadas com hIFN-y apresentavam MHC Classe II, possibilitando a ativação de células T auxiliares CD4+ - que desempenham um papel central no sistema imunológico.
Ao desenvolver uma vacina personalizada com células tumorais do paciente, ele encontrou uma maneira de fazer com que o sistema imunológico detectasse e atacasse efetivamente as células cancerígenas. Por meio de mais investigação e desenvolvimento, o Dr. Kreutz fundou a FK-Biotecnologia em 1999 no Brasil e a CellVax Therapeutics Inc em 2020 nos EUA. Ambas as empresas de biotecnologia estão focadas no desenvolvimento de novas terapias para o tratamento de câncer. Além de sua atuação médica, Kreutz também desempenha papel como investidor e empreendedor no setor de biotecnologia.

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