11/01/2023 às 15h32min - Atualizada em 11/01/2023 às 15h32min
Psicoterapeuta comenta pesquisa que aponta os efeitos do isolamento social no cérebro dos adolescentes
FONTE: Jimena Carro - [email protected] - FOTO: Reprodução Google
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Helen Mavichian, profissional especializada em crianças e adolescentes, fala sobre o processo de maturação prematura do cérebro em fases da vida em que ele ainda está em desenvolvimento
Uma pesquisa recente realizada pela Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, trouxe um resultado inédito e curioso sobre o cérebro dos adolescentes relacionado ao isolamento social provocado pela Covid-19. Ao comparar as avaliações de jovens antes da pandemia e após o fim da rigidez no isolamento, os pesquisadores descobriram um crescimento no hipocampo e na amígdala, áreas responsáveis pelo acesso a algumas memórias e regulação de medo, estresse e outras emoções. Ou seja, os adolescentes passaram a apresentar características neuroanatômicas mais típicas de indivíduos mais velhos ou que experimentaram adversidades na infância.
“Tal crescimento é esperado na fase de puberdade, porém o estudo concluiu que esse processo de desenvolvimento parece ter sido intensificado na crise sanitária que vivemos. É como se o cérebro deles estivesse três anos mais velho do que era antes da pandemia. Casos de maturação prematura do cérebro, antes da pandemia, eram vistos apenas após situações de estresse crônico na infância, trauma, abuso e negligência. Essas experiências adversas tornam as pessoas mais vulneráveis a uma saúde mental mais precária e resultam em um neurodesenvolvimento desadaptativo, que indica a maturação cerebral acelerada ou envelhecimento. É algo associado não apenas a uma saúde mental mais precária, mas também a resultados de neurodesenvolvimento desadaptativos que indicam maturação cerebral acelerada ou envelhecimento”, comenta Helen Mavichian, psicoterapeuta especializada em crianças e adolescentes.
O estudo, realizado por Ian Gotlib, professor de Psicologia da Stanford e diretor do Laboratório de Neurodesenvolvimento, Afeto e Psicopatologia da universidade, começou originalmente há 8 anos com um trabalho longitudinal envolvendo 220 crianças com idade entre 9 e 13 anos. Porém, quando o mundo parou em razão do coronavírus, os pesquisadores tiveram de interromper a coleta de dados e decidiram mudar o foco da pesquisa, a fim de entender como a pandemia poderia impactar a estrutura física do cérebro das crianças e sua saúde mental. Isso permitiu comparar jovens de 16 anos antes da pandemia com diferentes jovens de 16 anos avaliados após a pandemia.
A pandemia parece ter alterado a saúde mental e o neurodesenvolvimento dos adolescentes, pelo menos no curto prazo. A tarefa para os pesquisadores agora é determinar se essas alterações têm efeitos temporários da pandemia ou mudanças estáveis que caracterizam a atual geração de jovens. Para isso, eles destacam a importância de continuar acompanhando e avaliando os indivíduos que participaram da pesquisa.
“Sem dúvida, a pandemia tem sido fonte de grandes adversidades para todas as gerações, ainda mais para as crianças e adolescentes em virtude das restrições e fechamentos de escolas. O isolamento social potencializou o surgimento de sintomas internalizantes como os níveis de depressão, ansiedade e medo, entretanto, esta é a primeira vez que pesquisadores conseguiram medir isso nos cérebros, mostrando alterações significativas em sua saúde mental e neurodesenvolvimento”, relata Helen.
Os efeitos da pandemia podem ser facilmente percebidos ao observar o aumento da procura por sessões de terapia. Uma pesquisa da ABPS (Associação Brasileira de Psicologia da Saúde) aponta que 83,5% dos psicólogos notaram um crescimento de demanda de pacientes durante a pandemia, sendo que 86% perceberam uma intensificação de sofrimento nos relatos. “A grande verdade é que os impactos da Covid-19 estão estampados em nossa sociedade e não podemos mais tapar os olhos. Pelo contrário, é preciso acolher e cuidar para minimizar seus efeitos”, conclui a psicoterapeuta.