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23/02/2023 às 15h46min - Atualizada em 23/02/2023 às 15h46min

Quando o cachê é muito, prefiro menos Bündchen e mais lúpulo

FONTE E FOTOMONTAGEM: Gabriel T. Bertozzi
A AMBEV parece não ter seguido a máxima do livro bíblico, “...o que uma mão faz a outra não precisa saber...”, no que tange ao cachê milionário ofertado à celebridade Gisele Bündchen, em troca de algumas horas de permanência da modelo no camarote da Brahma durante desfile na Sapucaí, no Rio de Janeiro, na noite de domingo (19), segundo noticiado pela Folha de S. Paulo.
A divulgação da “esmola demais” convertida em pagamento de US$ 2milhões (aproximadamente R$ 10 milhões) de cachê, parece ter sido a estratégia da Brahma, usada para santo nenhum desconfiar, mas para mortais indignarem-se, e em ação prosaica, entenderem o famoso “falem bem ou falem mal, mas falem de mim”.
 
Particularmente não vejo outro sentido no vazamento dessa informação comercial que não seja justamente a proposital promoção de choque e perplexidade na geração intensa de comentários atrelados à postura de soberania e poderio da marca.
Não tenho formação nas áreas de publicidade e marketing. Sou agrônomo e minha base relembra aulas em que um saudoso professor nos provocava na citação efusiva de que a indústria cervejeira carregava subsídios, visto que a água seria insumo gratuito. Os palpites e opiniões dessa narrativa partem de dias empresariais e profissionais compondo vivência tanto para o questionamento coerente como para a incompreensão pertinente na busca do propósito que uma marca de cerveja deseja extrair quando proporciona desembolso fútil em lugar tão longínquo da realidade de seus consumidores e leads. Absolutamente nada tenho contra a profissional Gisele. Mas que marketing é este que origina aberrações publicitárias como esta em tempos tão carentes de valores e outras necessidades dos seres?
 
Sou empreendedor. Acredito no capital produtivo. Mas há tempos venho acumulando indignações por observar o banal e o inverídico tomarem frente no modus operandi das grandes marcas. Os conglomerados, com todo o poder de fogo que possuem, poderiam contribuir com a sociedade utilizando de suas forças e exposição, mas se comportam lançando produtos de qualidade inferior entrelaçados a publicidades rasas e infrutíferas do ponto de vista da contribuição cultural, social, econômica e nutricional. Caberiam aqui muitas outras classes de contribuições agregadoras de valores na tentativa de qualificação de termos que ouso cunhar autoria com hashtags #ativismodemarca e #verdadeempreendedora.
 
Em minhas ingênuas e modestas concepções do conceito de marca, entendo não caber mais nas prateleiras e no bolso dos consumidores, composições de custos e ingredientes que, em suas receitas, não representem lenitivos mínimos de dores, inclusão de valores e atendimento às necessidades ou prazeres legítimos. Empenhar campanhas que, no intuito de alcançar ilusões e pirotecnias, trazem acopladas ingredientes de “pó de pirlimpimpim” em experiências de consumo incompatíveis com o bom, é procedimento arcaico e não elucidativos das mazelas cotidianas.
 
Quem pode me dizer o quanto a presença de Gisele em poucos flashes tomados no camarote da Brahma agrega na escolha de uma lata de cerveja? Não valeria mais a busca por atributos verdadeiros perseguidos pelo paladar? Ou ainda o ativismo aplicado a uma causa nobre em favor de uma sociedade melhor? Por qual razão preferem fomentar um Big Brother a contribuir com uma cultura real de mobilidade urbana, por exemplo? Ou de atitudes de solidariedade e cooperação genuína? Quem sabe, instruir sobre cobrança de direitos e transparência em esfera pública? O elenco de demandas em prol do coletivo, da ética e dos bons costumes seria grande no imaginário publicitário criativo que, a meu ver, está colapsado no repertório de campanhas milionárias e ao mesmo tempo pobres. Vale rememorar o conceito corporativo da moda advindo da sigla ESG, onde nomes novos, ainda que substituindo conceitos antigos sólidos, sobem o tom na ordem da boa gestão socialmente consciente e ambientalmente sustentável. Seguramente a AMBEV tem seu departamento estruturado de ESG. Mas parece que perderam linha e carretel na tentativa de empinar uma marca pautados pelos atributos da bela. Que bom que se proliferam cervejarias artesanais com menos Bündchen mas com mais lúpulo.
 
Por Gabriel Tarquínio Bertozzi - Engenheiro agrônomo e empresário
Facebook: Gabriel Tarquinio Bertozzi – Instagram: @gabrieltarquiniobertozzi
 
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